terça-feira, 4 de abril de 2023

DIPLOMACIA BRASILEIRA DURANTE O SEGUNDO REINADO



 


O Brasil, após a consolidação do regime monárquico e a coroação de D. Pedro II, estava disposto a adotar políticas autonomistas para com a Inglaterra, principal potência do século XIX. As relações com este país estavam sendo herdadas dos compromissos antes assumidos com Portugal, que estava, diante da Era Napoleônica, numa situação de dependência aos interesses nacionais ingleses. Com o processo de independência política do Brasil, Inglaterra manteve sua hegemonia sobre os assuntos no Primeiro Reinado. No entanto, com o amadurecimento político das oligarquias nacionais e uma insinuante diplomacia, o Brasil foi palco de eventos que redimensionaram as relações anglo-brasileiras. Além disso, a potência emergente, os Estados Unidos da América, apesar de não estar totalmente definida com relação aos seus interesses internos e externos, também aparece neste cenário de transformações.

A Inglaterra tinha interesses nas independências americanas, especialmente as de colonização ibéricas. O território era muito extenso com matérias-primas e potencial mercado consumidor. O livre comércio dava vantagens aos ingleses pois o país era considerado a oficina do mundo e seus produtos eram ofertados em escala maior do que os do restante da Europa, pelo seu pioneirismo na Revolução Industrial. Mesmo com outros países entrando no mercado internacional de mercadorias, a exemplo dos EUA, era dever da Inglaterra manter sua hegemonia comercial através de uma diplomacia por vezes agressiva e de total colaboração com os capitalistas.

A diplomacia inglesa no Brasil foi extremamente favorável à independência política, pois era uma oportunidade de ampliar as negociações com um grande país emergente e carente de produtos industrializados, além da manutenção dos tratados de 1810, que dava privilégios ao mercado inglês e a possibilidade de concessão de empréstimos ao novo governo, principalmente para a indenização à Portugal.

Com o amadurecimento do Estado nação e a consolidação do regime monárquico após a pacificação interna, a política externa brasileira foi pautada por uma autonomia nacionalista, dinamizada pela expansão das exportações de café. Além disso, a diversificação comercial da Segunda Revolução Industrial, com ampliação da concorrência no mercado, ofereceu ao Brasil alternativas comerciais com outras potências europeias, além dos próprios Estados Unidos.

RELAÇÕES POLÍTICO-COMERCIAIS COM A INGLATERRA

A presença da casa dos Rotschild, banqueiros ingleses, no Brasil, foi muito marcante. Estes foram os principais financiadores da modernização durante o Segundo Reinado. Serviços urbanos e de comunicação foram áreas que receberam seguro investimento. A situação da Inglaterra era bastante cômoda, assegurada ainda pela sua marinha de guerra.

Com a considerável vantagem, a Inglaterra impôs a promulgação do Bill Aberdeen, de 1845, que com o fito de acabar com o tráfico negreiro mundial, especialmente no maior país escravocrata do sul do continente americano. A ideia era transformar os então escravos em mão de obra assalariada, o que reverteria em capitais para os produtos ingleses. Com isso, a noção humanitária está em cenário de fundo. O Brasil cede à pressão com a Lei Eusébio de Queiroz (1850), proibindo o tráfico negreiro, sob o argumento de que havia provisão de escravos consolidada no país. Apesar de que os barões de café fluminenses não tenham aceitado esta argumentação. Na verdade, o Brasil tinha interesses políticos na bacia do Prata, à época rivalizando com a Confederação Argentina, havendo o receio de perder sua frota naval num eventual conflito com os ingleses. Além disso, desafiar os ingleses diplomaticamente poderia resultar na debandada de capitais necessários para as inovações em todos os setores do Império.

No entanto, em 1863, a conhecida Questão Christie, abalou as relações entre os países, havendo inclusive o fim das relações diplomáticas, pelo menos temporariamente. Esta ousadia foi facilitada pela concorrência que a Inglaterra estava sofrendo com seus vizinhos europeus e os Estados Unidos.

Em 1861, o navio Príncipe de Gales, que estava transportando mercadorias para o Uruguai encalhou (outros autores dizem que naufragou) na costa do Rio Grande do Sul. Os locais saquearam a carga. O embaixador inglês William Dougal Christie, responsabilizando os brasileiros, pediu indenização da carga roubada ao imperador D. Pedro II, o que foi imediatamente negado. Em 1862, marinheiros ingleses foram presos no Rio de Janeiro, acusados de arruaça, o que fez Christie dobrar a aposta. Apesar dos ingleses terem sido soltos rapidamente, o embaixador insistiu no pagamento da indenização da carga roubada e na prisão dos policiais que se atreveram a prender os marinheiros anglo-saxões, além do pedido público de desculpas. Irritado com a demora, Christie manda bloquear o porto do Rio de Janeiro e aprisiona cinco navios brasileiros ancorados.

Para que fosse resolvido, D. Pedro II pediu arbitragem do rei da Bélgica, Leopoldo I, para que julgasse as exigências do embaixador inglês. No entanto, o imperador, antes da sentença do belga, decidiu pagar a indenização referida ao saqueio no Rio Grande do Sul. Com a decisão tendo sido favorável, em 1863, D. Pedro pediu o reconhecimento ao julgado e exigiu de Londres compensação pecuniária aos navios que foram aprisionados pelo embaixador e o pedido de desculpas pelos ingleses. Com a negativa, o Brasil rompeu as relações políticas com a Inglaterra. De qualquer forma, após o início da Guerra do Paraguai, em 1865, por iniciativa dos ingleses, as relações foram restabelecidas.

A DIPLOMACIA COM OS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA


Os Estados Unidos não estavam muito interessados com o Brasil durante a Doutrina Monroe de 1823, exceto no que diz respeito ao Amazonas. Na verdade, havia indiferença entre os EUA e a América Latina. Os EUA sentiam-se ameaçados ainda pela Espanha e eventualmente com a França, esta que no governo de Napoleão III empossou Maximiliano de Habsburgo no trono mexicano, em 1864, e a aquela com a Guerra Hispano-americana de 1898, no contexto da independência cubana. A intenção da Doutrina Monroe pareceu ser a preparação dos EUA para imperializar as ex-colônias.

O interesse pelo Amazonas começa em 1850, expedições científicas foram enviadas e depois deram se as conversações comerciais. No entanto, a Guerra Civil (1861-1865) amansou os americanos e as relações com o Brasil se mantiveram amistosas. Além disso, o governo brasileiro estava atento ao potencial de periculosidade dos vizinhos do norte. Os contatos comerciais entre os dois países ficaram amistoso com as exportações de café, desde 1870, e laços de amizade estavam sendo afirmados, sendo D. Pedro II o primeiro monarca a ser recebido por um presidente americano, Ulisses Grant, em 1876, o qual visitou uma amostra internacional.

A diplomacia amistosa também funcionou quando, em 1869, o representante no Brasil de Washington, James Watson Webb, tentou pedir indenizações por um suposto saqueio de navios em portos brasileiros. Porém, o Secretário de Estado, Hamilton Fish, decidiu pela demissão de Webb, evitando qualquer desconforto.

A DIPLOMACIA NA REGIÃO PLATINA

A diplomacia no rio da Prata tinha como principal interesse consolidar o Brasil como potência regional, esta política de empoderamento daria proeminência ao império de navegabilidade para o interior do país, a exemplo do Mato Grosso, e impedir, eventualmente, que nações rivais ascendessem às suas fronteiras.

A Argentina seria a grande rival inicialmente, sua ajuda na guerra da Cisplatina (1825-1828) influenciou a independência do Uruguai, mas que não interferiu na livre navegação do rio, sendo o Brasil ainda muito beneficiado na dominação política uruguaia. A independência uruguaia estaria ameaçada em 1838, quando partidários uruguaios de uma união com a Argentina, denominados blancos, estavam sendo organizados pelo presidente da Confederação Argentina, Juan Manuel de Rosas. A favor da manutenção da independência e dos compromissos com o Brasil herdados dos acordos de paz de 1828, estavam os assim chamados colorados. Finalmente, em 1845, a Confederação Argentina decidiu romper as relações diplomáticas com o Império e demonstrou seu plano de restaurar o Vice- Reino do Prata, que incluía a anexação do Uruguai, Paraguai e parte da Bolívia.

O presidente do Uruguai, até 1838, Manuel Oribe, blanco, apoiava o expansionismo argentino, representando os latifundiários que tendiam a não aceitar a permanência de fazendeiros brasileiros dentro de território uruguaio. O poder no país, no entanto, estava com os colorados, comerciantes, aliados ao Brasil, liderados por Frutuoso Rivera. Com o cerco de Montevidéu por Oribe e Rosas, o Brasil tentou, em 1845, a missão Abrantes para incluir a Inglaterra a um posicionamento internacional, o que foi negado. O Brasil, sem o apoio de nação europeia, teria que dar satisfação aos gaúchos que detinham de 20% a 30% de terras na banda oriental e estavam sentindo a ameaça. A Guerra começou em 1850, em 1851 D. Pedro II recebeu o apoio de Urquiza, governador de Entre Rios, e Virasoro, de Corrientes, que eram províncias argentinas dissidentes. Na data de 1852, com a Batalha de Monte Caseros, Rosas e Oribe foram derrotados. A Confederação Argentina ficou sob a liderança de Urquiza e no Uruguai foi empossado Venâncio Flores. O tratado de 1851 favorecia os gaúchos, que não pagariam mais taxas alfandegárias, além do direito de posse das terras; o Brasil ficou assegurado da navegação no rio da Prata e os uruguaios tiveram que pagar indenização pelo auxílio que receberam no conflito.

O povo uruguaio não aceitou estas imposições, em 1860 os blancos retomaram o poder com Bernardo Berro pelas urnas e decidiram desfazer todas as medidas do tratado de 1851, desafiando os colorados. Na Argentina, em 1862, Bartolomé Mitre, assume a presidência, derrotando Urquiza em campo de batalha em Pavón, em 1861, favorecendo o unitarismo centralizador. Com o apoio de Mitre aos colorados na política interna uruguaia e a aproximação com o Brasil, aos blancos restaram apenas as forças derrotadas de seus ex contendores, Entre Rios e Corrientes. Não obstante, este vazio diplomático a favor dos blancos recebe a intervenção do Paraguai de Solano López, ditador do país.

O Paraguai se tornou independente com muitas dificuldades de território, havia contestação no oeste do Mato Grosso e ao sul, com territórios argentinos de Missiones e o Chaco. O Brasil reconheceu primeiramente a independência do país, em 1844, mas por causa da ameaça de Rosas de fundação de um novo vice reino do Prata, e a Argentina, em 1852, no contexto de derrota contra o Império. Com Argentina e Brasil virtualmente unidos na política externa, restaram aos blancos, eleitos em 1864, com a presidência de Aguirre, receber o apoio do Paraguai que estava tentando se intrometer nas disputas platinas e resolver as dificuldades territoriais.

Porém, Venâncio Flores contestava incansavelmente seus inimigos políticos, suas ações mantinham a presença do Brasil nos assuntos uruguaios. Os gaúchos, que estavam sendo desapropriados, reclamaram no não cumprimento do tratado de 1851 e pediram auxílio. Tentando apoiar os nacionais, o Império enviou a missão Saraiva, para tentar salvar o tratado em seus acordos estabelecidos. A missão foi fracassada, os uruguaios decididamente não respeitavam as cláusulas estabelecidas. Ainda em 1864, o governo brasileiro enviou um ultimato aos blancos, o que o Paraguai não aceitou e mandou outro para o Brasil. Sem tomar conhecimento da intromissão paraguaia, D. Pedro II permite a invasão do Uruguai. Em retaliação, Solano López apreende o navio mercante Marquês de Olinda com o presidente do Mato Grosso. O Império, com isso, rompeu as relações diplomáticas.

A Guerra não havia sido formalmente declarada e Solano López já invadira o Mato Grosso e, para invadir também o Rio Grande do Sul, atravessou sem permissão a província de Missiones, na Argentina. O ditador paraguaio tinha convicções que se mostraram equivocadas. Acreditava que os blancos tinham capacidade reativa contra Brasil e Argentina de Mitre. Ao superestimar seu próprio exército, tentou fazer da ocupação de Missiones e, tomando Corrientes, impressionar Urquiza, governador de Entre Ríos, para influenciar na política platense pela demonstração de força. A reação dos argentinos foi inesperada para o paraguaio, pois sua ação uniu Urquiza e Mitre. A ideia do ditador teria sido demonstrar sua capacidade militar para derrotar o Brasil, o que não convenceu os argentinos com território invadido.

Em 1865, os países aliados formalizaram a Tríplice Aliança, com a Argentina unida, o Brasil e o Uruguai de Venâncio Flores. O tratado decidia acabar com a pessoa de Solano López, liberar a navegabilidade nos rios Paraguai e Paraná e, secretamente, tomar territórios paraguaios em disputa.

A invasão paraguaia ao Rio Grande do Sul foi pífia, sendo derrotados na batalha do Riachuelo e rendidos em Uruguaiana. O Paraguai entrara numa aventura megalomaníaca, não tinha uma frota naval para enfrentar o Brasil e logo ficaram sem comunicação com o mundo após seus acessos pelos rios terem ficado bloqueados. Por terra, os aliados, ainda em 1865, cercaram os paraguaios após as batalhas de Humaiatá e Tutiuti. O Paraguai já estava acuado em 1866, quando os brasileiros assumiram todo o quadro de operações. A derrota em Curupaiti não arrefeceu as tropas brasileiras e ,em 1869, a capital Assunção foi finalmente tomada. A guerra estaria encerrada apenas em 1870, com o fim do ditador em Cerro Corá, o que estava acertado pelo tratado da Tríplice Aliança.

As perdas territoriais paraguaias para a Argentina foram enormes. Para evitar um expansionismo argentino na região, o Brasil negociou secretamente com os sucessores constitucionais de López tentativas de impedir que Sarmiento, sucessor de Mitre, tomasse mais territórios ao modelo desejado por Rosas. Os argentinos temiam que Uruguai e Paraguai se tornassem estados satélites do Brasil. Finalmente, Buenos Aires se tornou capital do país. O Brasil, endividado e com altas baixas relativamente aos aliados, profissionalizou o exército. A unidade social foi representada pelos mitos de Jovita Feitosa, mulher que se travestiu de homem para lutar no front, e Cândido da Fonseca Galvão, homem negro que reuniu voluntários baianos para derrotar os inimigos em comum.



DIPLOMACIA COM RELAÇÃO ÀS REPÚBLICAS DO PACÍFICO

Os limites fronteiriços entre Brasil e Peru foram fixados , em 1851, não desconsiderando a presença portuguesa na área do rio Javari, numa diplomacia que considerou o Forte de São Francisco de Itabatinga, com a região explorada pelos portugueses e ocupada na segunda metade do século XVIII. Com a Bolívia, a internacionalização do rio Amazonas, em 1866, a diplomacia foi difícil. O Tratado de Ayacucho, de 1867, deixou pendências, os bolivianos tentavam pelo não demarcado Tratado de Santo Ildefonso (1777). Nisso, a livre navegação do rio Amazonas, que seria uma forma do Brasil não exercer seus domínios, principalmente durante a Guerra do Paraguai, não foi suficiente para apaziguar as relações com as repúblicas do Pacífico.

O Peru cortou relações com o Brasil por causa da Guerra do Paraguai, em 1867, com o apoio de Bolívia e Equador. O temor seria a cláusula de repartição do território paraguaio entre Brasil e Argentina, desconsiderando agressão paraguaia. O ressentimento com o Brasil, no entanto, começara antes da Guerra do Paraguai, quando a Espanha, motivada por apelos de nacionais que estavam sendo mal tratados nas novas republiquetas, enviou uma fragata para a América do Sul. Diante desta ação espanhola, o Brasil, que se preparava para a guerra, manteve a neutralidade, recebendo duras críticas. As relações com estas Repúblicas foram benéficas ao país ao longo do tempo .No início do século XX, com a diplomacia do barão do Rio Branco, durante a República, o país foi beneficiado em diversas pendências.


REFERÊNCIAS

SOARES, Rodrigo Goyena. História do Brasil I : O tempo das monarquias. São Paulo: Saraiva, 2016.

VICENTINO, Cláudio; DORIGO, Gianpaolo. História do Brasil. São Paulo: Scipione, 1997.


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